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O Brasil sempre estará aqui

Foto do escritor: Instituto Não Aceito CorrupçãoInstituto Não Aceito Corrupção

Por Roberto Livianu

03/03/2025 13h01  


Há quase trinta anos, em Central do Brasil, Dora foi vivida pela magistral Fernanda Montenegro. Voltamos ao red carpet sob a mesma direção de Walter Salles e vencemos. O filme brasileiro Ainda Estou Aqui obteve três históricas indicações ao Oscar, como melhor filme internacional, melhor filme, e melhor atriz para Fernanda Torres. Por Central do Brasil, comparativamente, faltou apenas a indicação a melhor filme.

 

Depois de Fernanda Torres e Walter Salles terem percorrido mais de 100.000 km promovendo o filme, dos prêmios importantíssimos como o de melhor roteiro em Veneza, com aplausos de pé por dez minutos, do Globo de Ouro para Fernanda como melhor atriz, conquistamos o Oscar de Melhor Filme Internacional, após quase um século da criação do prêmio.

 

Ultrapassamos cinco milhões de espectadores nas salas dos cinemas brasileiros, uma marca simplesmente antológica, contando a trágica história de Rubens Paiva, sequestrado, torturado e morto pela ditadura militar em 1971, vivido por Selton Mello e a resistência de sua mulher Eunice Paiva, encenada brilhantemente por Fernanda Torres e ao final por sua mãe Fernanda Montenegro, que tudo disse sem palavra alguma pronunciar.

 

Quando a legendária atriz Penélope Cruz anunciou "The Oscar goes to I am still here" dezenas de milhões de brasileiros gritaram e choraram emocionados. Estavam irmanados acompanhando a cerimônia, ansiosos unidos pelo país como há muito tempo não se vê nem em tempo de Copa do Mundo de Futebol. O filme reproduz uma parte de nossa história e o sentimento geral é que Fernanda nos representa.

 

Ineditamente, ao final do desfile da Imperatriz Leopoldinense o locutor interrompeu a transmissão para anunciar a premiação. Sim, claro, que a conquista seria muito mais completa se Fernanda tivesse ganho a estatueta como melhor atriz e surreal se tivéssemos ganho as três. Mas precisamos sempre saber valorizar a parte cheia do copo e, pela primeira vez na história do Oscar, um filme brasileiro brilha, nesta indústria totalmente dominada pelo cinema estadunidense.

 

A Academia de Los Angeles quis transmitir mensagens claras este ano, pois mesmo com 13 indicações, Emilia Pérez faturou apenas dois prêmios, sendo derrotado por Ainda Estou Aqui em Melhor Filme Internacional. Aponta-se como fator decisivo publicação de postagens por Karla Sofia Gascón de cunho intolerante.

 

Apresentadores de TV mexicanos celebraram a derrota ao vivo ostensivamente pela suposta depreciação ao México pelo filme. Por outro lado, historicamente pela primeira vez um negro ganhou o Oscar pelo figurino – Paul Tazewell, por Wicked.

 

Nenhum documentário foi tão comentado e tão aclamado como No Other Land que foi premiado, narrando as agruras vividas na Cisjordânia nestes tempos de conflito entre o Hamas e Israel. Anora, o grande vencedor do Festival de Cannes, arrebatou os Oscars de melhor filme, melhor direção, melhor atriz, melhor roteiro original e melhor edição mergulha no submundo da prostituição em Nova York, narrando a história de uma stripper de 21 anos que se casa com um de seus clientes, herdeiro de uma oligarquia russa.

 

A Academia resolveu distinguir o filme brasileiro, que descortinou a ditadura brasileira, diante das produções francesa, alemã, dinamarquesa e letã, que pautavam o mundo das drogas mexicano, questões complexas da vida iraniana, um drama existencial alemão e uma animação infantil letã – um gato que enfrenta um apocalipse num cenário em que Trump inicia seu segundo mandato, tomando decisões totalmente despreocupadas com os ditames democráticos. Percebe-se um claro recado da Academia aos ditadores.

 

Vivemos num país há quase dez anos intoxicado pela polarização política, entretanto um de seus elementos, o autoritarismo descortinado, ironicamente, é o mote do filme e serviu para nos unir. Tudo ficou de lado em pleno carnaval, o Brasil parou e vibrou por Ainda Estou Aqui e por Fernanda Torres.

 

Roberto Livianu, procurador de Justiça do Ministério Público de São Paulo, é doutor em Direito Penal pela USP, idealizador e presidente do Instituto Não Aceito Corrupção e integrante da Academia Paulista de Letras Jurídicas

 

 
 
 

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