LIGIA MAURA COSTA 02 FEVEREIRO 2024 | 5min de leitura
A Operação Lava Jato, renomada investigação anticorrupção, completa uma década em 17 de março de 2024, suscitando inevitáveis reflexões sobre seus profundos impactos no país. Essa investigação teve papel fundamental ao expor à sociedade os atos corruptos praticados no cenário político e empresarial brasileiro. Paralelamente, ao longo dessa década, o mundo testemunha uma maior conscientização dos aspectos ESG (ambiental, social e de governança) em relação aos investimentos. A definição de investimento ESG abrange uma diversidade de possibilidades, podendo envolver desde investimentos em empresas de energia renovável e até mesmo participações em multinacionais de tecnologia verde ou social. A busca por práticas empresariais sustentáveis, éticas e transparentes experimentou um grande crescimento, a partir do momento em que investidores passaram a valorizar empresas comprometidas com alguns princípios fundamentais, como integridade, diversidade, inclusão, sustentabilidade e boas práticas de governança corporativa. Este marco de uma década da Lava Jato revela os vários desafios a serem superados no enfretamento da corrupção no país, mas, também ressalta uma evolução impulsionada de fora para dentro, da busca de um ambiente de negócios mais sustentável e mais ético.
Essencialmente, investir em ESG é sinônimo de investimento socialmente responsável ou sustentável, que integra na tomada de decisões não apenas os riscos financeiros tradicionais, mas que considera os riscos ambientais, sociais e de governança corporativa. Atualmente, os investimentos ESG se traduzem cada vez mais em métricas, classificações e ações concretas. Para garantir o bom desempenho dos aspectos ESG, a integridade corporativa surge como elemento fundamental, devendo ser compreendida como pilar essencial tanto do ESG quanto do investimento sustentável em geral. É curioso, porém, como o papel da corrupção é frequentemente negligenciado na construção dessas métricas, classificações e ações concretas.
A corrupção é uma preocupação para todas as empresas e governos, ou pelo menos deveria ser. Embora alguns setores possam estar mais expostos a riscos de corrupção do que outros, é inegável que nenhum deles está imune às consequências financeiras decorrentes de atos corruptos, quando esses são expostos. No contexto de investimentos ESG, os riscos de corrupção estão diretamente relacionados ao “G”, de governança corporativa. Práticas corruptas frequentemente permitem a perpetuação de comportamentos corporativos corrosivos, não apenas do ponto de vista financeiro, mas também ambiental e social. Dessa forma, o combate a corrupção não é importante apenas para preservar a integridade das organizações, mas também para resguardar os princípios que permeiam os aspectos ambientais, sociais e de governança corporativa.
O consenso global sobre o papel que as empresas podem desempenhar no combate à desigualdade social, violações aos direitos humanos e mudanças climáticas pode se tornar uma folha ao léu, se não for contida e combatida a corrupção. Todos os stakeholders – acionistas, investidores, gestores de investimentos, agências de classificação, órgãos reguladores, entre outros – devem dar prioridade à integridade nos seus investimentos. Colocar a integridade no centro das prioridades de investimento aumenta as probabilidades de que as promessas ESG se traduzam em ações concretas.
A corrupção afeta prejudicialmente o valor das ações de uma empresa, estimulando práticas financeiramente insustentáveis que favorecem decisões de curto prazo, frequentemente respaldadas por relatórios financeiros fraudulentos ou com “inconsistências contábeis”. Isso pode resultar em cifras bilionárias, como evidenciado recentemente no caso das Americanas, onde tais práticas comprometeram significativamente a integridade das informações contábeis, afetando a confiança dos investidores e o valor de mercado da empresa. Esse lamentável episódio reforça a necessidade de promover uma transparência mais robusta como forma de proteger a saúde financeira e a reputação tanto das empresas quanto do mercado como um todo.
A mitigação dos riscos de corrupção deve ser parte integrante das métricas de investimentos ESG. Se uma empresa for construída sobre uma base corrupta, é apenas uma questão de tempo antes que a realidade venha à tona. Quando exposta, a corrupção leva a perdas financeiras gigantes, danos à reputação e até mesmo recuperação judicial e falência. Uma então gigante brasileira de engenharia e construção até 2019, se viu compelida a requerer a recuperação judicial para reestruturar uma dívida de 51 bilhões de reais, ao ter exposto pela Lava Jato o escândalo que estava envolvida de corrupção transnacional. A corrupção pode e deve servir como indicador-chave da saúde financeira de uma empresa. Por essa razão, é importante considerar os riscos de corrupção ao avaliar as carteiras de investimento ESG.
Ao completar uma década, a Operação Lava Jato coincide com uma crescente conscientização nos investimentos dos aspectos ESG. O investimento em ESG é uma estratégia cada vez mais adotada, que reflete uma mudança na mentalidade dos investidores, que buscam práticas empresariais mais sustentáveis e éticas. Apesar dessa evolução, o combate à corrupção no país ainda é bastante negligenciado. O consenso global em torno do papel das empresas na promoção da equidade social, direitos humanos e sustentabilidade só será eficaz se a corrupção for contida e combatida. Posicionar o combate à corrupção no centro das prioridades de investimentos ESG é necessário para aumentar a probabilidade de transformar as promessas ESG em ações concretas. Essa abordagem assegura um futuro verdadeiramente sustentável e íntegro aos investimentos.
Este texto reflete única e exclusivamente a opinião do(a) autor(a) e não representa a visão do Instituto Não Aceito Corrupção (Inac). Esta série é uma parceria entre o Blog do Fausto Macedo e o Instituto Não Aceito Corrupção. Os artigos têm publicação periódica
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